segunda-feira, 5 de agosto de 2013

O poeta inglês William Blake diz que o caminho do excesso leva ao palácio da sabedoria. Lemok, o personagem narrador de Pandemonium, talvez não encontre um palácio ao final de sua jornada, mas sem dúvida trilha a passos largos os caminhos e descaminhos do excesso. Ou dos excessos, no seu caso. E por mais que beba todo tipo de álcool barato, aspire as mais tortuosas carreiras de cocaína e se embrenhe por intrincadas e sinuosas vaginas esfíngicas, consegue sempre manter à vista uma bússola que lhe indica algum destino possível. A agulha ereta dessa bússola é a própria narrativa de Zeca Fonseca, vigorosa como um pontapé. Ou um gancho no fígado. Seguindo a melhor tradição de grandes fodedores que revolucionaram a literatura ocidental, como Henry Miller e Charles Bukowsky, Zeca Fonseca consegue manter o foco literário mesmo quando coloca Lemok para analisar fezes na privada, dissertar sobre o valor medicinal da urina quando ingerida ou descrever as fragrâncias ginecológicas de uma velha senhora desfalecida ao seu lado, na cama. A literatura de Zeca Fonseca não faz concessões ao politicamente correto ou ao literariamente palatável. Como Dante, ele sabe que uma passagem pelo inferno é inevitável de vez em quando e que uma prosaica desilusão amorosa pode desencadear as mais terríveis e desesperadas consequências afetivas e estéticas. Zeca Fonseca tem a consciência de que no grande e barulhento sertão de uma metrópole, as veredas são os canos do esgoto. Tony Bellotto.