domingo, 20 de novembro de 2011

Casamento x Futebol

Quando eu era bem pequeno me fizeram aquela pergunta clássica “o que você quer ser quando crescer?” E eu, do alto de meus cinco anos, disse:
“Quero ser homem casado.” Todos riram daquela minha frase, porque imaginaram uma resposta como ‘quero ser bombeiro’, policial ou qualquer outra coisa, menos homem casado.
Bom, meus pais não se preocuparam com aquilo. E sempre contavam a história em tom de piada. Eu nunca entendia a graça da piada; e só hoje, depois de dois casamentos fracassados, consigo entender o que tem de hilário naquele meu desejo infantil.
Eu sempre quis ser o chefe de uma família feliz, pois era assim que eu via a minha própria família. Uma ilha cercada de felicidade por todos os lados. Tudo era perfeito, apesar dos percalços normais que por vezes desestabilizavam aquela felicidade reinante na ilha, ou seja, na família.
O tempo passou e eu casei com a mãe de meu filho, ainda na faculdade. Éramos o casal cult da PUC no início dos anos 1980. Nosso filho nasceu logo, em 1982, em plena Copa do Mundo de Futebol. Aquela Copa foi disputada na Espanha e eu, como um bom viciado em futebol, queria ver todos os jogos. Fui forçado a mentir para minha esposa, e disse que estava fazendo hora extra no jornal em que trabalhava na época. Eu era responsável por render minha sogra que ficava com o nosso filho todos os dias para que pudéssemos trabalhar. E os jogos da Copa eram justamente no horário em que eu tinha de chegar para liberá-la. Resultado: a mãe dela passou a ficar até mais tarde para me esperar. Pronto, minha Copa estava salva, só não sabia que no final o Brasil seria desclassificado pela Itália do modo como foi, jogando melhor. Futebol tem isso que nenhum outro esporte tem – nem sempre vence o time que joga melhor. E foi assim naquela Copa de 1982 vencida pela Itália. O Brasil era muito melhor, e jogava um futebol bonito de se ver.
O tempo não parou e casei novamente, desta vez nasceu uma menina. Assim como no nascimento do meu filho, em 1992 o Vasco da Gama, meu time de coração, também foi campeão carioca. Hoje meu filho continua sendo vascaíno e isso é motivo de muito orgulho para mim. Minha filha foi contaminada pela família de sua mãe e hoje em dia torce pelo Flamengo. Isso poderia ser motivo de profunda tristeza para mim. Mas sei que um dia ela vai acordar desse pesadelo preto e vermelho em que vive.
Nesse ano meu time está demais. O Vasco já ganhou a Copa do Brasil, está em segundo no campeonato brasileiro e ainda tem chance de ganhar a Copa Sul Americana. Se isso acontecer será um feito inédito; nunca um clube brasileiro venceu essas competições em um mesmo ano.


Zeca Fonseca
Niterói, 18-nov-11

domingo, 6 de novembro de 2011

Rolling Tears ou “Mas foi o que aconteceu”

Eu tinha 17 anos nessa época. O mundo estava vivendo crises econômicas consecutivas. O planeta sofria com terremotos, vulcões entrando em erupção e outras desgraças como o aquecimento global que não cessa. Minha mãe vivia me falando para eu arrumar um bico para ganhar um dinheiro porque ela não podia mais me dar mesada.
Um vizinho meu tocava bateria muito bem, podia escutá-lo todos os dias; resolvi bater lá na porta dele e perguntar se toparia fundar uma banda comigo. Ele topou. Já tínhamos um cantor, eu; um guitarrista, eu; um compositor, eu; e um baterista, o Vizinho.
Nos primeiros dias a banda não tinha nome ainda, portanto esta foi a primeira coisa a fazer depois que determinamos que nossas bandas preferidas eram Magnetic Fields, Rolling Stones e Faces. Chegamos à conclusão que o nome de nossa banda deveria ser em inglês, já que nossas bandas de preferência cantavam em inglês. Eu disse que queria algo que de alguma forma reverenciasse essas bandas. Pensamos em várias alternativas. Faces foi logo descartado porque existe uma editora com este nome; sugeri Magnetic Tears e Vizinho retrucou dizendo:
“Rolling Tears.”
“Perfeito.” Eu disse. E era mais que perfeito aquele nome, pois tínhamos uma pegada meio melancólica.
E assim surgiu a banda.
Em um mês já tínhamos um baixista experiente e uma empresária dedicada.
Em dois meses já tínhamos uma música para iniciar o trabalho de divulgação da banda. Por incrível que pareça a música foi escrita pelo Vizinho, e ele mesmo cantava. Deu tudo certo no estúdio e a música encaixou. Eu fazia coro com o Vizinho no refrão. A música era meio grunge, meio balada de rock da antiga e conta a história de um homem que desiste de viver apesar de não ter motivo para isso; nenhuma tristeza para justificar um suicídio, mas foi o que aconteceu segundo a própria letra da música. Esse era o refrão que eu cantava com o Vizinho suicida. Sim, foi isso mesmo que aconteceu. O vizinho, depois do estouro da Rolling Tears no mercado fonográfico, resolveu se suicidar tal qual a letra que ele escrevera; sem motivo, sem tristeza. Entrou do banheiro e só saiu de lá numa maca – morto.
Em três meses não havia mais banda. Não havia mais nada. Eu fiquei mal. Era como se eu tivesse morrido e não o Vizinho. Não saía mais de casa e não encostava mais na guitarra. O baixista já estava em outra banda, e a empresária sumiu. Comecei a tomar remédios fortes contra depressão. Queria gritar, ou explodir se fosse possível.
Resolvi me matar quando meu pai abriu a janela aberta e disse enquanto admirava o mar:
“Isso é que é vida...” Eu dei inicio a uma corrida calculada em direção à janela e quando cheguei perto da janela me atirei de cabeça no embalo. Ainda senti minha calça roçando a camisa de meu pai. Não queria mais viver, mas me arrependi no momento em que senti o ar – queda livre, sem volta.
Escutei o som do grito de meu pai se afastando, senti vontade de dizer que amava ele como amava minha mãe. Queria morrer antes de atingir o solo, foi a última coisa que deu tempo de pensar.

Zeca Fonseca
Niterói, nov 2011

sábado, 5 de novembro de 2011